quinta-feira, 25 de setembro de 2014

Octávio Paz: produção cultural e trajetória política recente



            O escritor mexicano Octávio Paz (1914-1998) é considerado um dos maiores escritores do século XX e um dos maiores poetas de fala hispânica de todos os tempos; seus poemas tornaram-se conhecidos a partir da década de 1930, mesmo período em que iniciou sua militância política de esquerda: em 1937 foi um dos delegados mexicanos ao Congresso Antifascista realizado na Espanha republicana, em plena guerra civil.
            Adquiriu ambas, o amor pela literatura e a militância política, no berço: seu avô, Irineu Paz, intelectual liberal e novelista, era um apaixonado pela literatura clássica e moderna; seu pai, Octavio Paz Solórzano, foi advogado de Emiliano Zapata em plena Revolução Mexicana e mais tarde deputado. Formado em direito, em 1937, estudou nos Estados Unidos nos anos seguintes. Sua carreira diplomática começa em 1945, tendo trabalhado na França, Índia e Japão. Abandonou a carreira em 1968, em protesto pelo massacre de Tlatelolco, onde policiais mexicanos dispararam contra estudantes durante protestos.
            Recebeu o prêmio Nobel de Literatura em 1990; a temática social é muito forte em suas primeiras obras; ao longo da carreira passou a centralizar sua atenção sobre temas existencialistas, como a solidão.
            A decepção com a esquerda começa ainda nos anos da Guerra Civil Espanhola; em 1951 ele denuncia abertamente os crimes stalinistas e o processo logo caminha para uma ruptura completa com os intelectuais de esquerda, que ele passa a criticar de forma cada vez mais ácida. Identificado com as idéias da terceira via, a partir da década de 1970 define-se como um liberal.

            Sua obra literária possui diversas facetas, mas sua reflexão política sem dúvida nenhuma é a que gerou maior número de polêmicas: a crítica feroz que fazia ao autoritarismo do mundo socialista e ao sistema político mexicano pós-revolucionário conhece uma progressiva evolução na profundidade de análise ao longo dos anos 60 e inicio de 70; muitos críticos avaliam que sua capacidade intelectual decresceu desde então, chegando ao ponto mais baixo quando decidiu apoiar a candidatura de Carlos Salinas à presidência, em 1988, e seu intenso programa de privatização da economia mexicana.
            O próprio Paz dedicou-se a um trabalho autobiográfico extremamente crítico, em 1993; seu livro Itinerário faz uma longa reconstrução crítica de sua reflexão política: os anos de desencantamento com o socialismo (1939-1959); seguem-se três décadas de crítica feroz à atuação da esquerda: para ele a grande crítica ao comunismo

está baseada no fato de, ao instaurar em termos filosóficos uma “lógica da história” como uma instância superior e alheia à vontade e intenções dos homens, abriu a porta pra que na realidade política concreta se cometessem as piores atrocidades contra os indivíduos, existindo sempre a possibilidade de justifica-las acudindo ao chamado desse futuro que, infalivelmente, haveria de alcançar-se”. (LEDESMA, 279)

            Paz admite que a queda do Muro de Berlim e o repentino desmoronamento de todo o mundo socialista, a partir de 1989, o pegaram desprevenido, inclusive a derrota dos sandinistas nas eleições de 1990. Paz admite sua surpresa:

"Siempre creí que el sistema totalitario burocrático que llamamos 'socialismo real' estaba condenado a desaparecer. Pero en una conflagración; y temí que en su derrumbe arrasase a la civilización entera. "La velocidad de los acontecimientos lo asombra: "No preví que un hombre y un grupo, colocados precisamente en lo alto de la pirámide burocrática, ante la descomposición del sistema, se atreverían a emprender una transformación de la magnitud de ésta que presenciamos."(MONSIVAIS, p. 79)

            Sua análise das causas para o rápido desmoronamento do sistema socialismo fez com que se enamorasse então do discurso que apresentava as forças de mercado como o meio que alavancava o avanço e a busca da igualdade e da liberdade. Chegou a escrever entusiasmado sobre isso, em 1990. E nesse contexto abraçou o projeto de privatização de Carlos Salinas, que enxergava então como a única forma de quebrar o controle que políticos do PRIa exerciam sobre a economia mexicana; como declarou na época:

            “Uno de los rasgos que ha distinguido al PRI de otros partidos ha sido su inserción en el Estado y, a través del Estado, en la economía: las poderosas empresas estatales. Los miembros del PRI ejercen sucesiva o simultáneamente, funciones políticas, económicas y administrativas en el gobierno. De paso: ésta es una de las razones que explican la lentitud y la dificultad del proceso democrático en México. Algo semejante, aunque en mayor escala sucede en los antiguos países comunistas. Pues bien, las privatizaciones han desalojado a los políticos y los burócratas de varios centros vitales de la economía mexicana. Así se ha despejado, en parte, el camino a la democracia."(Idem)

            O namoro foi de curta duração; Paz agora denuncia que as privatizações de Salinas produziram uma espiral espantosa de corrupção no país e dirige suas críticas às filosofias que vêm no mercado a solução de todos os males sociais:

“Ayer dijimos el horror que sentíamos ante lãs injustifcias del sistema totalitário comunista; com el mismo rigor debemos ver ahora a lãs sociedades democráticas liberales. Su defensa, siempre condicional y sujeta a caucion, debe continuar pero transformada em uma crítica de sus instituiciones, su moral y sus práticas, sociales y políticas” (Itinerário, p. 124)

            Concorda humildemente com algumas das críticas que sempre recebeu da esquerda e até então havia negado e desdenhado: enfocou suas baterias críticas fundamentalmente contra os problemas do mundo socialista, e apenas com o fim deste passou a ver com o mesmo rigor as sociedades democráticas liberais. Condena o discurso de “fim das utopias”, “fim do socialismo”; para ele agora o que acabou foram os regimes opressores; o verdadeiro socialismo precisa ser resgatado:

“...no fue ni es utopia: es um ideal respetable y em muchos aspectos admirable. Debemos rescatar lo que tengha de rescatable. Y tiene muchas cosas rescatables” (idem, p. 193)

            É um imenso périplo que retorna ao ponto de partida: Paz surpreendeu a intelectualidade de esquerda em 1950 ao dirigir uma crítica feroz ao regime estalinista; num artigo intitulado “Os campos de concentração soviéticos” ele afirmou que não se podiam confundir o fracasso das ditaduras burocráticas que se auto-intitulavam socialistas com o próprio ideal socialista. O poeta, clara e enfaticamente, assinala que os crimes destes regimes são exclusivamente deles, não podem ser atribuídos às idéias socialistas. Quase meio século depois, Paz retorna com intensidade ao mesmo discurso.

Chiapas 1994: a crítica da modernidade ou a modernidade crítica.

            A publicação de Itinerário ocorreu quase simultaneamente com a rebelião zapatista de Chiapas. Octávio Paz envolveu-se então numa de suas últimas polêmicas: cinco dias após o inicio da rebelião o escritor assinou um artigo chamado “O nó de Chiapas” em que fazia uma análise feroz do movimento: “No debe olvidarse que lãs comunidades indígenas han sido enganadas por um grupo irresponsable de demagogos”.
            Sua opinião produziu uma chuva furiosa de críticas, sobretudo partidas da intelectualidade mexicana, que Paz desqualificou em outro artigo escrito dois meses depois:

“Triunfo de la literatura: gracias a la retórica y a su indudable talento teatral, el subcomandante Marcos há ganado la batalla de la opinion. Em esto, no em uma pretendida ‘postmodernidad’, reside el secreto de su popularidad entre los intelectuales y entre vários sectores de la clase media de nuestra capital”.

            Dois anos depois sua opinião sobre os neozapatistas havia mudado; num artigo de fevereiro de 1996 ele escreveu:

“Coincido com Marcos em que, em esta hora de México y del mundo, nos hace falta um proyecto nuevo. El mio es muy vago pero incluye a todos, sin exceptuar a los excomulgados por uma u outra inquisicion. Ademas, creo que esse proyecto no puede ser unicamente nacional”.

            Palavras de sua última aparição pública, em dezembro de 1997:

“Ahora se habla mucho de democracia em México, solo que, em general, se la reduce a uma serie de ideas y de conceptos. No, la democracia es tambén uma prática. A su vez, lãs práticas sociales, al arraigarse, se convierten em hábitos y costumbres, em maneras de ser. Para que la democracia funcione realmente debe haber sido previamente asimilada e incorporada a nuestro ser mas intimo. La democracia debe transformarse em um a vivencia. Esto es lo que, todavia no sucede em México”. (LEDESMA, p. 286)


 Bibliografia

LEDESMA, Xavier R. El Siglo de um poeta: la reflexion política de Octavio Paz. In Estúdios sobre lãs Culturas Contemporâneas, no. 22, diciembre 2005, pp. 275-290. Universidad Autônoma del Estado de México.

MONSIVAIS, Carlos. Adonde yo soy tú somos nosotros, Octavio Paz: crónica de vida y obra. Mexico, 2000. Hoja Casa Editorial; disponível em: http://www.excentricaonline.com/libros/escritores_more.php?id=6231_0_8_0_M

PAZ, Octavio. Itinerário. México, 1994. F.C.E.

___________. The media spetacle comes to Mexico. New Perspectives Quarterly v11 (Spring 94) 59-60.


SOLANO, Patrício. Octavio Paz: el hombre y su obra. Disponível em: http://www.ensayistas.org/filosofos/mexico/paz/introd.htm


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